II
ATIVIDADES DE ENSINO
Neste capítulo, percorro os caminhos
que me levaram à carreira docente e, em especial, ao Departamento de
Antropologia da FFCH, onde estou lotada desde meu ingresso na UFBA em 1982 e,
ao NEIM. Relaciono, também, os cursos de pós-graduação aos quais estive e estou
vinculada, destacando, aqui, as disciplinas oferecidas ao longo dos anos
(minhas atividades de orientação, bem como participação em bancas de avaliação
de trabalhos acadêmicos e em cursos, serão relacionadas em outro capítulo).
2.1 Ensino de Línguas
Quando
criança, uma das minhas atividades favoritas era ‘brincar de escolinha’, eu
fazendo o papel de professora. Mas, na verdade, nunca me interessei por cursar
Magistério (na minha época, chamado de Curso Normal) – ensinar crianças
pequenas nunca fez parte dos meus desejos. O ensino em si me interessava e
minha primeira atividade remunerada acabou sendo o ensino de inglês como professora
particular. De fato, um dos benefícios mais significativos de minha estadia nos
Estados Unidos com a bolsa do American Field Service – AFS foi o aprendizado da
língua inglesa, o que me possibilitou também ensinar esse idioma. Comecei,
assim, a ensinar inglês para jovens e adolescentes como professora particular,
atividade essa iniciada logo após meu retorno dos Estados Unidos como bolsista
e que se estendendeu até minha de volta para lá, após meu casamento (08/1966 a
12/1967).
Todavia,
verdade seja dita, minha clientela era reduzida, limitando-se a colegas e
irmãos e irmãs menores de amigas e colegas. Para ganhar a atenção desses
jovens, minhas aulas eram baseadas em canções de preferência dos e das alunas,
valendo-me das letras para discutir interpretação de texto, expressões
idiomáticas e gramática inglesa. Trabalhei também como professora de inglês,
desta feita para o Fisk, em Salvador, Bahia, quando me mudei de volta para o
Brasil (01/1981 a 07/1981), usando para tanto o método definido por essa escola
de línguas.
Tive
também a oportunidade de ensinar português para americanos. A primeira vez foi
como atividade voluntária vinculada à Communiversity, um programa da Student
Union (União de Estudantes) da Illinois State University – ISU para a
comunidade local, na época em que cursava o Bacharelado em Antropologia
(1976-1977). A segunda deu-se em Salvador, no início dos anos 1990, quando
trabalhei como consultora para o Curso English
For You elaborando material didático e lecionando português para uma turma
de professoras e professores americanos da Escola Panamericana de Salvador.
2.2 Ensino
no Âmbito Acadêmico Anteriores à UFBA
Este
ano de 2016 estarei comemorando 40 anos de ensino no âmbito acadêmico! Comecei
a ensinar antropologia em 1976, na qualidade de monitora enquanto aluna de
graduação, continuando até os dias de hoje, oferecendo disciplinas de teoria
antropológica para estudantes de graduação e pós-graduação. E, desde a criação
do Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres,
Gênero e Feminismos – PPGNEIM da UFBA, em 2006, venho também ministrando
seminários de teoria feminista.
2.2.1
Monitoria (Undergraduate Teaching Assistantship – UTA) no Departamento
de Antropologia da Illinois State University-ISU (1976-1977)
Quando
passei a cursar o Bacharelado em Antropologia na ISU, em tempo integral, tive
conhecimento da oferta de bolsas de monitoria para graduandos, me inscrevendo e
sendo selecionada para ser monitora na disciplina “Introduction to Cultural
Anthropology”, ministrada pelo Prof. Dr. Robert Dirks nos semestres I e II do
ano letivo 1976-1977, pelo que também recebi os devidos créditos.
Minhas
tarefas como monitora nessa disciplina incluíam o acompanhamento das aulas
ministradas pelo Dr. Dirks, a compilação das listas de chamada, dar assessoria
a estudantes no uso das Human Relations Area Files e participação na elaboração
e correção das provas. Além disso, tive também que elaborar e apresentar uma
aula durante o semestre, escolhendo, para tanto, a temática da Evolução Humana,
apresentada sob o título “The Scheletons in Our Closet”. Boa parte dessa
apresentação se baseou na disciplina “Human Evolution”, oferecida pelo Prof.
Dr. Martin Nickels, no Departamento de Antropologia da ISU, uma das melhores
disciplinas que tive o prazer de cursar!
Essa
experiência de monitoria foi fundamental, não apenas para o meu treinamento no
ensino de antropologia, como também para a definição da minha carreira como
docente. Foi ali que tomei gosto pelo ensino universitário e me apaixonei pela
antropologia, tendo muito a agradecer ao Prof. Dirks por ter contribuído para
que eu seguisse nessa direção - uma decisão da qual jamais me arrependi.
Illinois State University - ISU
Normal, Illinois, USA
2.2.2 Graduate
Teaching Assistantship (GTA) e Graduate Teaching Fellowship (GTF) na |Boston
University (1978-1979)
Como aluna
do Programa de Doutorado em Antropologia da Boston University, atuei como
Graduate Teaching Assistant (GTA) da Profa. Dra. Susan Brown e, posteriormente, como Graduate Teaching Fellow (GTF)
da Profa. Dra. Maureen Giovannini, na disciplina “Female Perspectives on the
Study of Cultures.” Oferecida para todos os programas da BU, com aulas
duas vezes por semana, essa disciplina reunia turmas de mais de 100 alunas/os,
em um grande auditório, para uma conferência-aula semanal com a docente
responsável. No outro dia de aula as
reuniões se davam em grupos menores, cada um com cerca de 25 estudantes, sob a
responsabilidade das “Teaching Assistants” (alunas de primeiro ano da
pós-graduação) e “Teaching Fellows” (segundo ou mais anos de pós-graduação).
No
ano de 1978, fui responsável por duas turmas dessa disciplina, uma por
semestre. Tratava-se de uma disciplina introdutória à Antropologia da Mulher,
então despontando no cenário acadêmico nos Estados Unidos, representando, para
mim, também o ingresso no campo dos estudos feministas, dessa feita como
docente, com destaque para a Antropologia Feminista, campo da Antropologia ao
qual venho me dedicando desde então!
Foi
em preparação para essa disciplina (‘Female Perspectives...’) que vim a ler a
monografia de Yolanda e Robert Murphy (1974), Women of the Forest, sobre os índios Munduruku, objeto da resenha
publicada na Women in Anthropology
Newsletter (SARDENBERG, 1977f) e, posteriormente, trabalho no qual me
baseei também para escrever “Matrilocality and Patrilineality in Munduruku
Society: A Re-examination form a Feminist Perspective” (SARDENBERG, 1980).
Para
essa disciplina, também me embrenhei na leitura da coletânea Towards an Anthropology of Women,
organizada por Rayna Reiter (1975), cuja introdução bem discorre sobre a
questão do male bias, o viés
androcêntrico na Antropologia, com reflexões que me ajudaram a desenvolver uma
leitura crítica feminista de textos antropológicos. Essa coletânea, é bom lembrar, contém, dentre
outros artigos, o texto maravilhoso de Gayle Rubin (1975), “The traffic in women:
notes on the ‘political economy’ of sex”, hoje um ‘clássico’ no qual a autora
teoriza sobre o sistema sexo-gênero, essencial para a construção da
problemática de gênero; o artigo de Ruby Rohrlich-Leavitt, Barbara Sykes e
Elizabeth Weatherford (1974), “Aboriginal Woman: Male and Female Perspectives”,
do qual fiz uso, anos mais tarde, na elaboração de meu texto sobre ordens
prático-simbólicas da menstruação (SARDENBERG, 1994), sobretudo no que diz
respeito a visões distintas entre homens e mulheres sobre a menstruação; o de Karen Sacks (1974),
“Engels Revisited: Women, the organization of production, and private
property”, que traz um importante diálogo com Engels na perspectiva da
Antropologia Feminista e; o artigo de Susan Brown (1974), uma das professoras
responsáveis pela disciplina em questão, “Love Unites Them and Hunger Separates
Them: poor women in the Dominican Republic”, onde ela trata do fenômeno da
“monogamia em série” praticada por suas interlocutoras, bem como pelas
ex-operárias da Fábrica São Braz que estudei para a minha tese de doutoramento.
Tudo isso mostra que o ensino é, de fato, um importante meio de
aprendizado!
BU- Boston University, College of Liberal Arts
Boston, MA
2.2.3
‘Lecturer’ no Programa de International Development and Social Change da Clark
University, Worcester, Massachusetts, USA (1986)
Por convite da então Coordenadora do Departamento de ‘International
Development and Social Change’ (atualmente, Department of International
Development, Community, and Environment) da Clark University, Profa. Dra.
Barbara Thomas-Slayter, atuei no segundo semestre de 1986 como docente
responsável por duas disciplinas: ‘Introduction to Cultural Anthropology’
e ‘The Family and Sex Roles’.
A primeira disciplina
(‘Introduction’) se baseava em ementa curricular semelhante à disciplina na qual
eu havia trabalhado como monitora do Prof. Robert Dirks na ISU, congregando,
também, uma turma com mais de 100 estudantes. Isso me obrigou a fazer
avaliações baseadas em provas com questões objetivas, principalmente porque eu
não tinha monitoras/es trabalhando comigo. Já na outra disciplina sobre família
e papéis de gênero, com uma turma de estudantes menor (cerca de 40 alunas/os),
foi possível trabalhar mais com discussões na sala de aula e avaliações mais
qualitativas.
Nas
duas disciplinas, porém, tive a oportunidade/liberdade de trabalhar com uma
perspectiva de gênero, feminista, em um momento em que essa perspectiva se
firmava como ‘Antropologia do Gênero’. Trabalhei com a coletânea organizada por
Michelle Z. Rosaldo e Louise Lamphere (1974), Women, Culture, and Society, traduzida para o português e publicada
no Brasil em 1979, sob o título “A Mulher, a cultura e a sociedade”. Em
especial, trabalhei com o artigo de Nancy Chodorow (1974), “Estrutura Familiar
e Personalidade Feminina”, além do texto de Carol Stack, “O Comportamento
Sexual e Estratégias de Sobrevivência numa Comunidade Negra Urbana.” E como não poderia deixar de ser, também me
baseei no texto de Sherry Ortner, “Está a Mulher para o Homem, assim como a
Natureza está para a Cultura?”. Recemente, tive a oportunidade de escrever uma
resenha especial desse texto, que irá integrar uma nova tradução dessa clássica
coletânea!
Clark University - Worcester, MA, USA
2.2.4 Professora Assistente na Univ. Católica
de Salvador (03/1982-09/1982)
Em
Março de 1982, me candidatei e fui selecionada para atuar como Professora
Assistente na Escola de Serviço Social da Universidade Católica de Salvador –
UCSal, na Bahia, ficando responsável pela disciplina Antropologia Social.
Naquela época, a diretora da Escola era a Profa. Liliana Mercuri, que me
confiou essa disciplina a ser oferecida no primeiro semestre de 1982, para uma turma de mais de 50 alunas do Curso de Serviço
Social.
Foi
a minha primeira experiência docente em âmbito universitário no Brasil,
exigindo de mim muitas horas de preparo semanal para as aulas, haja vista que
todo meu treinamento acadêmico anterior havia sido feito nos Estados Unidos e,
portanto, na língua inglesa, havendo assim muitos termos técnicos que eu
desconhecia em português. Lembro-me que percorria as prateleiras da Livraria
Civilização Brasileira, então na Rua Carlos Gomes, à procura de livros de
antropologia que pudessem me ajudar a encontrar os termos apropriados no preparo
das aulas. Foi assim que lendo Roberto Cardoso de Oliveira (2000), Roberto da
Matta (1978), Gilberto Velho (1978) e a
coletânea organizada por Edson Nunes (1978), comecei a mergulhar na
‘antropologia brasileira’, um mergulho necessário dado o meu treinamento
anterior que colocava as antropologias de ‘outros mundos’ nas margens.
Confesso,
porém, que estranhei muito a dificuldade em encontrar livros sobre
‘antropologia da mulher’ e ‘antropologia de gênero’ produzidos aqui. A
coletânea Perspectivas Antropológicas da
Mulher, organizada por Bruna Franchetto e Maria Luiza Heilborn (1982) foi
uma feliz exceção. Aliás, faço uso dessa coletânea até hoje, inclusive no
semestre atual em que leciono a disciplina Curso Monográfico em Antropologia
Feminista.
Vale
registrar que, mal terminei o semestre em questão me vi acamada, com hepatite,
não podendo assumir uma nova turma na UCSal de imediato no semestre seguinte.
Logo depois, fui notificada de que havia sido convocada para assumir o cargo de
Professora na Universidade Federal da Bahia, para o qual havia prestado
concurso público no início do ano. Interrompi assim meu repouso forçado pela
hepatite para entrar com meu pedido de demissão da UCSal e assinar meu contrato com a UFBA.
Universidade Católica de Salvador - UCSAL
Campus da Federação
Este
ano de 2016, completo 34 anos como docente da Faculdade de Filosofia e Ciências
Humanas (FFCH) da Universidade Federal da Bahia, no Campus de São Lázaro –
minha segunda casa por todos esses anos!
Mas minha primeira visita à FFCH e, mais especificamente, ao
Departamento de Antropologia, órgão no qual estou lotada desde 1982, se deu há
mais tempo, em outubro de 1980, logo no mês seguinte a minha mudança de Boston
para Salvador com a família.
Naquela
época – e, na verdade, por muito tempo – o Departamento de Antropologia ficava
na ‘senzalinha’, uma pequena edificação entre o ‘casarão’ de São Lázaro e o
prédio de Psicologia, para nós conhecido como ‘Iguatemi’. Eram quatro pequenas
salas cheirando a mofo e cheias de insetos repugnantes, transformadas depois em
instalações para uso dos vigilantes até que, já caindo aos pedaços, foi
derrubada para dar lugar a barraquinha de Dona Teresa.
Na
primeira vez que lá estive, conversei com a Profa. Dra. Yeda Castro, Chefe do
Departamento, que me informou sobre os planos de um concurso público para
teoria antropológica, com a abertura de várias vagas. Interessada no referido
concurso, voltei ao departamento meses depois, desta feita grávida de 4 meses
de meu filho, João, e trazendo comigo minha filha Marina, à época com 18 meses.
Encontrei-me, novamente, com a Profa.Yeda, então Chefe do Departamento de
Antropologia, que me apresentou à Profa. Consuelo Pondé, sua vice, que faleceu
em 2015. Lembro-me que ficamos as três conversando sobre as dificuldades
enfrentadas por nós, mulheres, para dar conta das demandas da vida acadêmica
tendo que cuidar também da família, Consuelo afirmando que, assim mesmo, criara
4 filhos.
Voltei
mais uma vez ao departamento depois do nascimento de meu filho, para me inscrever para o Concurso, mas o tão
esperado edital ainda não havia sido
publicado. Conheci então o Prof. Jeferson Bacelar, chefe do
Departamento, que me convidou para participar como palestrante da Semana de
Antropologia, a se realizar no início de dezembro. Recordo-me que esse evento
foi realizado no Museu Costa Pinto, no Corredor da Vitória. Na noite da minha
fala, levei meu filho João, então com três meses, pois ainda o amamentava. Ele
dormiu serenamente no cestinho, só acordando para mamar... Nessa mesma noite,
conheci a Profa. Maria Hilda Paraíso, atual Diretora da FFCH, e os Profs. Luiz
Mott, Ronaldo Senna, Thales de Azevedo e Vivaldo Costa Lima, todos do
Departamento de Antropologia, ali presentes. Conheci também a Profa. Dra.
Eunice Durham, da USP, palestrante convidada. E encontrei mais uma vez o Prof.
Jeferson Bacelar, que me falou da vaga de docente para a disciplina
Antropologia Social na UCSal.
Todavia,
o edital para o tal concurso da UFBA – que abriria mais de 400 vagas para
docentes em vários departamentos - só sairia no ano seguinte (1982). Fiz logo
minha inscrição, mas tive uma desagradável surpresa, quando a Congregação da
FFCH não pode homologá-la em virtude de meus diplomas, tanto o de Bacharelado
em Antropologia, da ISU, quanto o de Mestrado em Antropologia Social, da BU,
não estarem ainda revalidados no Brasil. Fui informada, porém, que para
revalidar meu diploma de Bacharelado, eu teria que voltar a cursar disciplinas
de graduação, muito embora já tivesse o Mestrado. Já meu diploma de mestrado da
BU havia acabado de chegar, mas estava sem o reconhecimento do Consulado
Brasileiro em Boston. E o tempo urgia!
Resultado:
com um empréstimo de meu amigo José Sérgio Gabrielli, meu colega na Boston
University e desde nos anos 1980, também na UFBA, comprei passagem e viajei da
noite para o dia para Boston, obtendo a documentação e assinaturas necessárias
na BU para o devido reconhecimento no Consulado, voltando de imediato a
Salvador. Tudo isso em um espaço de 3 dias, tempo suficiente para dar entrada
no pedido de revalidação do diploma de Mestrado na UFBA e, com ele, solicitar,
mais uma vez, a homologação da minha inscrição para o concurso para ingresso no
Departamento de Antropologia, só assim deferida. Mas valeu a pena!
O
Concurso foi realizado em abril daquele ano (1982), constando de prova teórica
escrita, prova didática e análise de currículo com base em barema específico.
Na prova escrita, sentei-me entre Ordep Serra, hoje Professor Aposentado do
Departamento de Antropologia, e Roberto Albergaria, também aposentado pelo
Departamento e meu querido amigo, recém-falecido. Antes do sorteio do ponto,
comentávamos como poderia cair qualquer um, menos ‘Métodos e Técnicas de
Pesquisa em Antropologia’, que implicaria em uma longa discussão. Para nosso
desalento, porém, eis que esse tal ponto foi o sorteado! Mais creio que me saí
bem...
Na
prova didática, contudo, me dei bem melhor: o ponto sorteado foi ‘Marxismo e
Antropologia’, tema constante do meu exame de qualificação para o doutorado na
BU, realizado um ano antes e sobre o qual eu me sentia bastante segura. Quem o
sorteou para mim foi a Profa. Dra. Luzinete Simões, então Vice Coordenadora do
Colegiado do Curso de Ciências Sociais da UFBA, hoje aposentada pela
Universidade Federal de Santa Catarina e minha parceira em várias atividades
vinculadas ao PROCAD – Programa de Intercâmbio Acadêmico que o PPGNEIM
desenvolve com a UFSC. Até hoje sou
agradecida à Luzinete...
Na
banca do concurso sentaram os Professores Luiz Mott, Carlos Ott e Julio Braga,
que me cumprimentaram ao final da aula, mesmo tendo eu passado um mau pedaço.
Na noite anterior, eu estava muito tensa dando os últimos retoques nos Planos
de Aula a serem entregues à banca no dia seguinte, após o sorteio do
ponto. Meus filhos, então pequenos,
Joãozinho ainda bebê, sentiram essa tensão e acordaram chorosos várias vezes
durante a noite. Para não perder a hora – o sorteio do ponto seria ao meio-dia
e eu não poderia atrasar – caí na besteira de tomar um ‘Reativam’, um
estimulante, que ajudou, mas não sem causar problemas. Poucos minutos antes de
concluir o tempo mínimo para minha aula, tive vários segundos de ‘branco total’.
Não sabia quem eu era, onde estava, o que estava acontecendo! Ainda bem que
consegui voltar a mim antes do tempo se esgotar e concluir a aula – tida como
excelente pelo Prof. Ott!!!
Passado
o concurso e tendo sido classificada dentro os cinco a serem convocados – Edwin
Reesink, eu, Roberto Albergaria, Yolanda Paradella e Ordep Serra, nessa ordem
de classificação – restou-me aguardar a chamada. Quando dois meses se passaram
e nada de convocação oficial, um grupo de candidatos e candidatas
classificadas/os no Concurso resolveu se reunir e pressionar a UFBA e, por fim,
o Ministério da Educação – MEC, para a implementação das vagas já abertas por
decreto. Foi nesse grupo que vim a conhecer minha grande amiga, Ana Alice
Alcantara Costa, aprovada no concurso para Ciência Política, com quem mais
tarde fundaria o Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher – NEIM e
daria início a nossa ‘aventura’ no Feminismo Acadêmico no Brasil, sobre o que
detalharei mais adiante (SARDENBERG, 2015a) .
Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher - NEIM/UFBA
Nosso
movimento, aliado ao dos estudantes em várias unidades da UFBA, demandando a
contratação das/os docentes classificadas/os – na FFCH, o corpo estudantil
entrou em greve – logrou um pequeno sucesso: um primeiro grupo de docentes foi
contratado, eu dentre eles. Assinei meu contrato como ‘Professor’ em 14 de
setembro de 1982, lotada no Departamento de Antropologia e Etnologia, passando
para o quadro da UFBA, como ‘Professor Assistente’ em julho do ano seguinte
(1983).
2.3. Departamento
de Antropologia e Etnologia da FFCH da UFBA
Ao longo
das quase três décadas e meia que venho atuando no Curso de Ciências Sociais
como professora, lotada no Departamento de Antropologia e Etnologia da UFBA,
fui responsável por várias das disciplinas ali oferecidas, a saber:
Antropologia I, Antropologia II, Antropologia III, Antropologia V, Etnologia
Geral e do Brasil, Técnicas de Investigação e Elaboração de Projetos (TIEP),
Técnicas de Investigação e Análise (TIA) em Antropologia, Prática de Pesquisa
em Antropologia, Curso Monográfico sobre Perspectivas Antropológicas sobre a
Mulher, Estudo de Sistemas de Parentesco, Seminário em Ciências Sociais, Etnografia,
Antropologia Brasileira Contemporânea e, no momento, finalmente, Curso
Monográfico em Antropologia Feminista.
Turma de Etnografia 2014
FFCH/UFBA
Por muito tempo, lutei pela criação
da disciplina ‘Antropologia de Gênero’ no Programa do Curso de Ciências
Sociais, mas não consegui entusiasmar meus colegas de departamento para que se
levasse a proposta adiante. O processo foi perdido, engavetado, sumiu! Só
consegui oferecer essa disciplina como ‘Curso Monográfico’, estando agora,
neste presente semestre, oferecendo finalmente o Curso Monográfico em
Antropologia Feminista. Já considero isso uma pequena vitória! Devo ressaltar, porém, que conseguimos
introduzir a disciplina Antropologia de Gênero no Programa do Bacharelado em
Estudos de Gênero e Diversidade, curso que brotou dos esforços da equipe do
NEIM.
É
claro que, a bem ou mal, a perspectiva da Antropologia Feminista se inseriu em
todas as disciplinas que ofereci ao longo das minhas três décadas e meia no
Departamento de Antropologia. Não haveria como não fazê-lo, vez que foi a
partir dessa perspectiva que fui construindo a minha aventura antropológica! Da
mesma forma, é a perspectiva antropológica que tem me guiado nas minhas
reflexões no campo dos estudos feministas, trabalhando eu, portanto, com um
duplo olhar crítico, tal qual enunciado já no artigo de Maria Luiza Heilborn et
al (1981) em “Perspectivas Antropológicas da Mulher.” A Antropologia Feminista,
produto desse duplo olhar crítico, se coloca assim em um campo fronteiriço e
nós, antropólogas feministas, como ‘forasteiras dentro’, com um pé dentro e
outro fora da Antropologia e, ao mesmo tempo, com um pé dentro e outro fora dos
Estudos Feministas.
Posso
então dizer que tenho levado a perspectiva da Antropologia Feminista para todas
as disciplinas que ofereci ao longo da minha carreira docente. E, na UFBA,
foram várias turmas de alunos e alunas que passaram por minhas salas de aula
nessas disciplinas, alguns e algumas hoje em posição de destaque, a exemplo,
dentre outros, do Deputado Afonso Florence, Ex-Ministro de Desenvolvimento
Agrário e hoje Líder do PT na Câmara Federal; do Vereador Gilmar Santiago, da
Câmara Municipal de Salvador; da Profa. Amelinha Maraux, que foi Vice Reitora
da UNEB e; da Profa. Carla Liane, atual Vice-Reitora da UNEB.
Como se verá em outro capítulo, tive
também a oportunidade de orientar vários alunos e alunas do Bacharelado em
Ciências Sociais com concentração em Antropologia na elaboração das suas
monografias de conclusão de curso, bem como diversos outros e outras como
bolsistas de iniciação científica.
Já servi o Departamento como Chefe
(1989-1991/1991-1993), já fui sua representante em colegiados de diferentes
cursos, em especial, o de Ciências Sociais, servindo nele como Coordenadora de
Colegiado (1993-1994), já fui até Vice-Diretora da própria FFCH. Mas confesso que não tenho uma boa veia
administrativa: prefiro a sala de aula! Continuo apaixonada pela Antropologia
e, espero, passando essa paixão para meus alunos e minhas alunas também!
Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas - FFCH/UFBA
Campus de São Lázaro, Salvador, BA
2.3.2 Programa
de Pós-Graduação em Ciências Sociais – PPGCS/UFBA
Minha associação com o Programa de
Pós-Graduação em Ciências Sociais da UFBA se iniciou em 1983, com a criação do Núcleo
de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher – NEIM, como parte do então
Mestrado em Ciências Humanas, na época, sob a coordenação da Profa. Dra.
Consuelo Sampaio.
Ao
longo dos anos, vivenciei as mudanças que ocorreram no Programa, ou seja,
de Mestrado em Ciências Humanas (que incluía
História) para Mestrado em Ciências Sociais (quando foi criado o Mestrado em
História) e, posteriormente, com a criação do Doutorado em Ciências Sociais,
para Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, tendo atuado, então, como
Vice Coordenadora do PPGCS ao lado do Prof. Dr. Paulo César Alves, o
Coordenador do Programa na época (1997-1999).
Como Professora Permanente do PPGCS, de 1983 a
2010, fui responsável pelas disciplinas: Estudos
Feministas, Dinâmica das Relações de Gênero, Raça e Classe, Estudos sobre
Gênero e Trabalho e Teoria Antropológica Contemporânea, algumas delas depois
oferecidas no PPGNEIM, a ser discutido mais adiante. Encontrei, no PPGCS, um
espaço aberto para o campo dos estudos feministas, não apenas na oferta de
disciplinas, como também na orientação de alunas e alunos do Programa. De fato,
como se verá adiante, no PPGCS orientei cerca de 20 alunos e alunas na
elaboração de suas dissertações de mestrado e teses de doutorado, tendo o
prazer de ter algumas das minhas orientandas (as Profas. Dras. Márcia dos
Santos Macêdo e Márcia Santana Tavares) trabalhando agora comigo no PPGNEIM.
2.3.3 Programa
de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e
Feminismos – PPGNEIM
O Programa de Pós-Graduação (Mestrado e
Doutorado) em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo da
FFCH da UFBA foi primeiro um grande
sonho da equipe do NEIM, que desde os anos 1990 acalentava a ideia de um
programa dessa ordem. Em especial, havíamos sido incentivadas a criar tal
programa por Sonia Alvarez, então Diretora da área de gênero na Fundação Ford,
junto com Mariza Navarro, que viera ao Brasil como consultora da Ford, para
avaliar os projetos que o NEIM desenvolvia com a apoio da Fundação, sobre o que
discorrei mais adiante.
Apelidado, por nós, de “Projeto Baby Doll Lilás”
(não me lembro o porquê do nome!), o projeto de pós-graduação do NEIM era
discutido na sala de visitas da companheira Ívia Iracema Alves, onde ela, Ana
Alice Costa, Alda Motta, Silvia Lúcia Ferreira, Elizete Passos e eu
trabalhávamos em uma proposta a ser apresentada para a Pró-Reitoria de
Pós-Graduação da UFBA. No entanto, naquela época, fomos desencorajadas a seguir
adiante com a proposta, pois ninguém acreditava que ela pudesse ser aceita pela
Câmara de Pós-Graduação da UFBA, muito menos pela CAPES.
Trata-se do Primeiro Programa desse tipo, não
apenas no Brasil, mas em toda a América Latina! Mais recentemente, foram
criados programas de doutorado em estudos de gênero em Córdoba, Argentina, na
Universidade de San Cristobal de las Casas, na Região de Chiapas, México e, no
ano passado, o Programa de Doutorado em Estudos de Gênero na Universidad
Autonoma Metropolitanta de Xochimilco, México, todos inspirados em nossa
ousadia no NEIM.
Primeira Turma do PPGNEIM
No PPGNEIM, atuo como Professora Permanente,
tendo sido responsável principalmente por disciplinas obrigatórias: a)
Seminários de Teorias Feministas I, que resgata algumas das principais
contribuições teóricas feministas nos estudos sobre mulheres e relações de
gênero; b) Seminários de Teorias Feministas II, oferecida só para alunas do
doutorado e voltada para a crítica feminista à ciência e para as epistemologias
feministas e; c) Seminários Multidisciplinares de Pesquisa, que se volta para
uma reflexão sobre as pesquisas desenvolvidas dentro das perspectivas
feministas.
Devido a minha responsabilidade pela oferta
dessas disciplinas - e mesmo tendo agora a colaboração de minha colega, Márcia
Macêdo, que assumiu Seminários de Teorias Feministas I -, só consegui oferecer
uma disciplina optativa: Dinâmica das Relações de Gênero, Raça e Classe, minha
disciplina favorita e que me inspirou na elaboração do artigo “Caleidoscópios
de Gênero: Gênero e Interseccionalidades na Dinâmica das Relações Sociais”,
recém publicado (SARDENBERG, 2015d). Sempre que ofereço essa disciplina (e faz
tempo que não o faço), inicio o semestre com o “Exercício dos Privilégios” (Privilege Exercise), por nos permitir
identificar e refletir sobre as marcas da interseccionalidade de gênero, raça,
classe, orientação sexual, etc., nas nossas vivências, antes de podermos
teorizar sobre tal fenômeno.
Segunda Turma do PPGNEIM
2.3.4 Programa
de Pós-Graduação em Antropologia - PPGA
O
Programa de Pós-Graduação em Antropologia-PPGA foi criado em 2007, época em
que, além de atuar como Professora Permanente no PPGNEIM (criado um ano antes),
eu ainda me encontrava como Professora Permanente do PPGCS, sendo responsável
pela orientação de alunos de doutorado. Assim, só em 2012, quando as
respectivas teses foram defendidas, foi que pude então participar do PPGA.
Desde
então, além de orientar uma dissertação de mestrado, já defendida, e uma tese
de doutorado em andamento, já fui responsável pela oferta de disciplinas
obrigatórias, a saber: a) Seminário Avançado de Teoria Antropológica (2014.1),
oferecida para alunos de Doutorado e; b) Teoria Antropológica Contemporânea
(2015.1), para alunos de Mestrado.
Confesso que, para mim, foi importante adentrar mais a fundo no ensino
da Antropologia, em nível de pós-graduação; constato, porém, que o viés
androcêntrico ainda permeia grande parte das abordagens na teoria
antropológica, até mesmo as mais recentes.
Turma Doutorado 2014 - PPGA/UFBA
2.4
Participação
como Docente em Cursos de Especialização (Latu Sensu)
Além de
participar como docente em cursos de pós-graduação stritu sensu, tenho participado também de cursos de especialização,
com destaque para aqueles oferecidos pelo NEIM/UFBA. Aliás, tive o prazer de organizar e coordenar
o primeiro curso dessa natureza que oferecemos, o Curso de Especialização em
Gênero e Desenvolvimento Regional, oferecido em parceria com a REDOR – Rede
Feminista Norte e Nordeste de Estudos sobre Mulheres e Relações de Gênero, com
apoio da Fundação Ford. Nesse curso, fui responsável pela disciplina
‘Seminários de Gênero e Desenvolvimento I’, oferecido de novembro de 2001 a
maio de 2002, além de orientar monografias, a serem discutidas no próximo
capítulo.
Confraternização Turma do Curso de Especialização em Metodologias do Ensino de Gênero
NEIM/UFBA
Participei ainda do Curso de
Especialização em Metodologias do Ensino de Gênero e Outros Temas Transversais,
oferecido pelo NEIM/UFBA em de abril/2004 a janeiro/2006, bem como do Curso de
Especialização em Gênero e Desenvolvimento Regional com Concentração em
Políticas Públicas, sendo responsável, em ambos, pela disciplina ‘Fundamentos
das Teorias de Gênero’, bem como pela
orientação de alunas do curso na elaboração de monografias.
No início dos anos 2000, voltei à
UCSal para atuar como responsável pela disciplina ‘Metodologia Científica’ no
Curso de Especialização em Terapia Familiar oferecido pela CEPEX, tendo também
orientado alunas desse curso na elaboração de suas respectivas monografias de
conclusão do curso, tal como discutirei mais adiante neste memorial.
Outro curso do qual tive participação
como docente, desta feita, responsável pela disciplina “Gênero nas
Organizações”, foi o Curso de Especialização Gestão Associativa e
Desenvolvimento Local, em dezembro de 2003, oferecido pelas Faculdades Olga
Mettig.